29 de abril de 2008

RESCALDO DO DEBATE SOBRE PASSAGEM DO ISCTE A FUNDAÇÃO

Na passada semana, concretamente na quarta-feira, o GAE promoveu mais um debate no ISCTE.

É importante referir que, embora se denote uma maior abertura por parte da instituição a este tipo de eventos, e reporto-me ao tempo em que o GAE iniciou a sua actividade, continuamos infelizmente a sentir alguns entraves à realização de actividades que saiam da rotina oficial do ISCTE.

É pena, pois quanto mais nos batemos por criar espaços e momentos de troca de ideias, não só entre estudantes, mas entre toda a comunidade do ISCTE, mais convictos estamos de não se tratar duma "sociedade amorfa", ou mesmo duma "geração rasca", para citar recentes pensamentos do nosso preocupado Presidente. Trata-se antes dum sentimento generalizado de que não fazemos parte de nada. Não somos chamados a nada. Não somos envolvidos em nada. Não nos pedem a opinião sobre nada. Apenas nos pedem, para nos dias das eleições, irmos votar na pessoa X, no programa Y. Passa-se assim lá fora, na sociedade portuguesa, e passa-se assim cá dentro, no ISCTE.

É triste constatar, que as más práticas começam e se consolidam na Universidade.

No nosso debate o objectivo foi confrontar duas posições manifestamente assumidas face à passagem do ISCTE ao modelo fundacional. Daí o convite ter sido dirigido a dois professores, membros das 2 listas representadas na Assembleia Estatutária. Apenas uma pequena justificação para o facto de não termos convidado nenhum dos estudantes membros. A verdade é que as suas posições são desconhecidas, não sabemos o que defendem nem o que rejeitam, face a isto, aliado a uma absoluta ausência de unanimidade no seu discurso, pois já houve divisão entre os seus membros, considerámos que não são representativos de nenhuma sensibilidade, nem da própria lista pela qual foram eleitos.

Ambos os professores foram claros nas suas posições, e é pública, na medida do possível, a defesa do modelo fundacional por parte da Lista I, e a sua rejeição por parte da Lista A.

As más práticas a que me referia anteriormente, remetem para vários momentos desde a aprovação pela AR do novo Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), consolidando-se ao longo de todo o processo de adequação ao mesmo, nomeadamente no funcionamento da Assembleia Estatutária e no que lá se vai passando.

Questionei fundamentalmente o professor Pena Pires, por considerar que a perspectiva defendida pelo professor Nuno David era bastante coincidentemente com a minha, sobre essenciamente os seguintes pontos:

1. Porquê a pressa em passar a Fundação?

2. O que vem resolver a Fundação?

3. Vale a pena ir com uma mudança desta dimensão para a frente, face ao absoluto desconhecimento que existe no seio da comunidade ISCTE?

No seu entender, o ISCTE está em falência absoluta, precisamos rapidamente de sair do buraco em que estamos. Na verdade, descreveu um cenário que no actual estado da economia em Portugal, só pode ser classificado como catastrófico. Mas apenas o ISCTE. É curioso como, para o bem, "maior taxa de empregabilidade", e para o mal, "instituição com maior problema financeiro do país", o ISCTE é sempre especial e único na sua condição, e por isso está sempre na "linha da frente" das grandes mudanças. Foi assim com Bolonha, e já está a ser com a Fundação.

Dá a sensação que somos um comboio que não pode parar, anda sempre para a frente, não olha a meios, não verifica o combustível, não faz reparações de fundo. . . mesmo que outros comboios já tenham desbravado esse mesmo caminho, e alterado a sua rota, o ISCTE tem de ir por ali na mesma!

Naturalmente que o ISCTE está em dificuldades financeiras. O Ensino Superior Público está em dificuldades. A desorçamentação neste sector tem-se vindo a acentuar, e concordamos que é necessário encontrar soluções, para este problema e para tantos outros que assolam o funcionamento das universidades.

Mas em que é que a Fundação vem contribuir para o alcance destas soluções?

Na verdade, a Fundação é mais um passo na desorçamentação crónica de que o Ensino Superior tem sido vitima, com a agravante de que a vem legitimar, propondo que passe a caber a um grupo de 5 personalidades externas à Instituição a gestão do património financeiro e do patrimóno humano. De referir, que essas 5 personalidades têm de ser aceites pelo Governo, o que chama logo a atenção para a legitimação da governamentalização e óbvia partidarização da gestão das Universidades. Não é, de certeza, este o caminho a seguir.

Outra coisa que é desprezada é o envolvimento dos que fazem parte desta Instituição neste processo. Não adianta chamar as pessoas a "sessões de esclarecimento". As pessoas não querem ser esclarecidas, mas sim ouvidas. Querem sentir que têm poder de decisão sobre o destino do local onde trabalham ou estudam, é o mínimo exígivel.

A verdade é que tudo isto poderia ter sido feito doutra forma.
O RJIES introduz um lógica nas Universidades absolutamente diferente, e o seu funcionamento como o conhecemos desde há 30 anos, foi radicalmente alterado, tal facto merecia uma discussão de fundo no ISCTE. Senado, Assembleia de Escola, Conselhos Pedagógicos e Científicos, as próprias turmas em si, mereciam ter sido palco dum debate estrutural sobre o Ensino Superior em geral, e sobre o RJIES em particular, mas infelizmente, nestas coisas da Democracia, o ISCTE não se chega à frente.
A Assembleia Estatutária é um orgão essencial na actual situação. Era fundamental que tivesse circulado, a partir dos orgãos responsáveis, informação sobre os seus objectivos, sobre o seu funcionamento, sobre a sua constituição. É inadmissível que a única fonte de informação seja um site voluntariamente feito pela Lista A.
A opção Fundação. No mínimo exigia-se seguir o espírito da Lei. Neste sentido, era recomendável o famigerado estudo comparativo do actual modelo, "consensualmente" tido como ineficaz, com as implicações do modelo fundacional. Alguma base empírica nas afirmações tão seguras sobre as vantagens da fundação, ou os transtornos do actual modelo, era capaz de ser boa ideia.

Em pleno mês de Abril faz falta relembrar determinadas conquistas, que insistem em ser esquecidas. Ironicamente são essas mesmas conquistas que, preversamente, permitem a obscuridade de todo este processo. A verdade é que os orgãos representativos caiem muito na armadilha de se tornarem representativos apenas dos seus membros, e estes esquecem-se muitas vezes o que os conduziu até lá. Cabe-nos a nós, aos que votámos e aos que não votámos, exigir o nosso maior envolvimento, reivindicando a nossa participação activa e esclarecida.

Pessoalmente, em relação à Fundação:

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!

Cântico Negro
José Régio

Margarida Santos

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